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[LZ] Estamos de mudança. Depois de 3 anos e meio morando em Londres partimos para nosso novo destino: Pretória, na África do Sul.
Ser expatriado implica em ser local demais para ser turista enquanto ainda se é estrangeiro demais para ser local. A gente vive entre esses dois mundos porque já chegamos sabendo que vamos partir. Sem saber exatamente a data (que é para ter ainda mais emoção), mas sabendo que nossa vida em cada lugar tem prazo de validade e dura exatamente o tempo suficiente para você não se apegar demais. Você aprende a amar, mas não se acomoda na hora de aproveitar porque sabe que não fica por tempo indefinido e realmente tem que desfrutar dos privilégios de cada lugar.
Posso falar muitas coisas de Londres, mas se eu fosse tentar definir essa cidade com uma única palavra seria: múltipla. São múltiplas culturas, múltiplas possibilidades, múltiplas oportunidades. Uma das coisas que eu mais amo na cidade é a imensa oferta cultural. Tantas opções gratuitas, para que a gente possa acessar sem nenhuma parcimônia. Um verdadeiro luxo poder entrar em um museu por meia hora ou por meio dia, sempre que quisermos.
Essa cidade me acolheu com um bebê. Fez com que eu explorasse todas as estações de metrô com zero acessibilidade subindo escadas carregando o carrinho com a criança dentro para cima e para baixo. Depois graduamos para o patinete e um mundo novo de possibilidades se abriu (não que a gente ficasse muito limitado antes disso). Encerro nosso ciclo com Londres com a sensação de que aproveitei muitíssimo de tudo que a cidade tem para oferecer para uma mãe e uma criança pequena. Perdi as contas de quantos museus visitamos com muita programação infantil muito maneira. Quantas peças de teatro assistimos. Quantos passeios incríveis fizemos.
Nessa reta final eu fico cheia de nostalgia. Enquanto vivemos o caos que uma mudança representa somos inundados com sentimentos conflitantes de saudade antecipada dos amigos que deixamos com um misto de expectativas pelo novo. Eu sempre falo que a cada mudança eu sinto uma mistura de frio na barriga com dor de barriga. Apesar de esta ser nossa sexta mudança internacional e já termos claros os processos, continua sendo trabalhoso, insano e muito cansativo coordenar tudo. Quando a última caixa com nossos pertences sai de casa a gente sente até um alívio.
Apesar de considerar um grande privilégio poder viver experiências internacionais tão enriquecedoras, essa nossa vida cigana tem pontos positivos e pontos negativos. Acessar novas culturas, ter a oportunidade de dominar novos idiomas e se abrir para aprender certamente pesam na balança como fortes prós. Porém quem mora fora também perde. Perde o convívio familiar, perde o acesso a rede de apoio. Passa perrengue. Precisa construir novas conexões. Não é fácil deixar para trás tudo o que conhecemos e se aventurar no desconhecido. Tem que ter coragem. Eu amo a seguinte frase: voar é deixar algum lugar. Sim, a gente alça voo e desbrava o mundo. Mas mesmo se a gente voltar, nunca voltaremos para o mesmo. O que a gente deixou para trás também muda. Voltar requer uma readaptação, como bem disse minha amiga Luna nesse texto.
Compartilhar o processo da mudança nas redes sociais funciona para mim como uma estratégia para enfrentar os altos níveis de estresse que permeiam a situação toda. Documentei tanto a mudança do Uruguai para Brasília em 2018 quando de Brasília para Londres em 2021. Quando comecei a compartilhar todo o processo nos stories (salvo em 3 destaques) muitas pessoas comentaram que acompanharam todas as mudanças. E apesar das incertezas que pairaram nesse último processo essa foi uma das nossas mudanças mais organizadas. Todo o trabalho prévio que me propus a fazer para deixar o processo mais fluido foi executado e terminei exausta e orgulhosa. A repetição é realmente um excelente recurso para internalizar demandas.
Um dos questionamentos que recebi mostrando todo o trabalho de retirar todos os quadros, fotos e prateleiras que pendurei na parede de casa foi justamente se valia a pena furar as paredes, passar trabalho para pendurar e depois retirar adesivo ou fechar buracos e consertar a parede de uma casa que a gente sabia que seria temporária. E eu não tenho dúvidas que arrumar a casa com objetos pessoais é imprescindível para construir um lar onde quer que a gente esteja. Nessa nossa vida cigana abrimos mão de estabilidade, de permanência. As nossas coisas, os objetos com nossas memórias que compõem a nossa casa e nos proporcionam senso de pertencimento.
Chegar no novo país, implica em alugar uma nova casa. A chegada do container, para mim, marca um importante passo no processo de adaptação. Quando finalmente desempacotamos nossas coisas sinto que a vida no novo país começou efetivamente e agora é ali que a gente tem que fazer dar certo.
Levamos um pouco de cada lugar com a gente. Nas nossas memórias, nos objetos que adquirimos ao longo do tempo e que passam a ter significados e carregar histórias. Além de peças de artistas locais, posters, imagens, temos muitos registros fotográficos em Londres. Fotos profissionais que com sensibilidade eternizaram visitas especiais, passeios pela cidade, festas, muito carinho e muita presença humana. Uma menção especial aos fotógrafos que estiveram presentes em tantos momentos marcantes na nossa vida nessa temporada Londrina.
Recebi muitos questionamentos sobre as saudades antecipadas de Londres e como lidar com a despedida. Quando chegamos eu já tinha muito claro que seria impossível fazer toda a programação que Londres oferece durante o nosso período aqui. Nem morando aqui indefinidamente seria possível. Dito isso, eu tenho a sensação de que aproveitei tudo o que pude dentro das minhas possibilidades. Em nenhum momento nessa reta final senti angústia de não ter aproveitado o suficiente ou de ter perdido oportunidades de desfrutar o que essa cidade tem de incrível para oferecer. Londres continua e a gente pode sempre voltar.
Agora a despedida das pessoas… essa sim eu sinto mais. Os amigos que fazemos, as relações que construímos, as pessoas que nos cercam e convivem conosco no nosso dia-a-dia... a despedida das pessoas é muito mais difícil. Eu me apego em saber que as essas também não são definitivas. É mais um ‘até logo' com a certeza de que voltaremos a nos reencontrar em outro lugar do mundo. O acolhimento que recebi aqui foi extremamente aconchegante. Não tenho dúvidas que o grupo de amigos que nos cercou nessa temporada teve um impacto imensurável na percepção positiva que levamos da cidade. Foi incrível compartilhar esse capítulo Londrino com todos vocês. 💛
Uma das minhas estratégias para encarar o caótico período de preparação do empacotamento da casa foi deixar um dia de respiro para encontrar amigas queridas e fazer um passeio por Londres. Escolhi o Tate Britain e foi um respiro em meio ao caos. Foi um boost de energia e bom-humor. Dito isso, as últimas semanas foram cheias de noites mal dormidas, despertares no meio da madrugada com o cérebro fervilhando e a gente rolando de um lado para o outro pensando mil coisas sem conseguir voltar a dormir. São tantas variáveis e inseguranças que a gente fica com as emoções a flor da pele. Facilmente irritáveis, pavio curtíssimo. É um período de altíssimo nível de estresse. As vezes não dá nem tempo de processar as despedidas porque simplesmente os dias passam voando e de repente chegou a hora de embarcar.
Com a partida da nossa mudança estamos hospedados na casa de amigos queridos enquanto as últimas providências são tomadas: faxina na casa, vistoria da imobiliária e entrega das chaves, venda do carro. Aproveitamos para encaixar todos os encontros possíveis nos intervalos de tempo entre uma pendência e outra. E nos organizar para viver os próximos 3 meses com o conteúdo de 3 malas de 23 kg e 3 malas de 10kg enquanto esperamos as nossas coisas chegarem no novo destino.
A primeira vez que chorei nesse processo de despedida foi quando ajudei David a preparar os cartões de despedida para as professoras. Foi emocionante ver ele ser acolhido na escola e evoluir tanto nesse último um ano e meio. Eu tenho um carinho muito especial pela primeira professora dele que é uma pessoa que passei a admirar ao longo do ano. Escrevei também um cartão meu para ela e fico com os olhos marejados só de mencionar isso por aqui. Tenho certeza que todas as nossas mudanças tem um fator extra importante a ser contabilizado agora que David já tem idade escolar. Quando viemos de Brasília para Londres, ele era um bebê. Agora ele deixa amigos, círculo social, professoras, um ambiente escolar que é exclusive dele. Um mundinho com nenhuma interferência nossa. E ele também vai ter que reconstruir todas essas relações. Começar do zero. Se readaptar em um novo ambiente, nova cultura, fazer novos amigos. Essa é sem dúvida uma das minhas maiores angústias e onde vou concentrar meus maiores esforços para proporcionar uma adaptação que seja o mais suave possível.
Por mais diálogo que exista e preparação para esse momento, para ele, assim como para nós uma mudança representa uma ruptura de tudo que é habitual. E a chegada em um lugar novo demanda um esforço imenso até que a gente consiga internalizar o nosso novo lar. Para quem também vai viver mudança com crianças, sugiro esse compilado com livros fofos que abordam o tema. Sempre uma boa pedida para criar repertório e identificação.
Já disse que deixo Londres com um sentimento de missão cumprida. Sinto que vivi tudo o que me propus viver nesse período aqui e quero receber de coração aberto as oportunidades do novo destino. Tenho grandes expectativas de desfrutar dias com abundante claridade. Muitas horas de luz solar. Apesar do frio não ser uma grande questão para mim, a escuridão do inverno me afetava de maneira negativa e eu estou aliviada de saber que no nosso futuro teremos muitos e muitos dias de céu azul pela frente. Minha grande ambição é praticar esportes a céu aberto, incorporar hábitos saudáveis no cotidiano e viver uma vida simplesmente tranquila. Onde David possa andar de bicicleta livremente e desfrutar de muito contato com a natureza andando de pés descalços na grama do nosso quintal.
Obrigada por acompanharem o capítulo Londrino das nossas vidas. Aproveito para estender o convite para conhecerem e desbravarem Pretória a partir do meu olhar.
Beijos,
Luisa Zuffo
💭 Dúvidas ou comentários são sempre bem-vindos. E se quiserem compartilhar as próprias experiências de mudança comigo, vou adorar ler tudo. 💛
Tava me preparando emocionalmente pra ler esse texto aqui. Que lindo, amiga. Foi demais curtir Londres com vocês. Que felicidade ter feito amigas pra vida toda, tipo você. E saber que fiz parte de várias aventuras londrinas contigo e Davizicos fazem meu coração ficar quentinho, apesar da saudade. Beijo!
Que texto maravilhoso e reconfortante! Também estou me preparando para mais uma mudança de país que acontecerá dentro dos próximos dois anos, será a minha 4º…
tenho um filho de 3 e estou gravida, então pude me identificar com muita coisa que você escreveu… o misto de ansiedade boa que o novo traz, com angustia de outro recomeço… sair da zona de conforto não é nada fácil né!!! Desejo muitas bençãos e toda sorte do mundo para vocês! Vou adorar acompanhar essa nova fase!